9 de maio de 2008

Um novo plano para a Amazônia

Governo federal lança pacote de medidas destinadas à região, com direito a R$ 1 bilhão para financiar projetos de reflorestamento. Programa prevê, também, o uso das florestas como garantia de empréstimos

Depois de cinco anos de discussão, o governo lançou ontem o Plano Amazônia Sustentável (PAS), que prevê a oferta das florestas nativas localizadas em fazendas da Região Norte como garantia real para financiamentos bancários. É o chamado penhor florestal. O plano também vai alterar a política agrícola oficial para permitir a inclusão de produtos extrativistas — como castanhas, frutas e látex das seringueiras — no programa de preço mínimo oficial. Isso significa que a Companhia Nacional de Abastecimento(Conab), do Ministério da Agricultura, garantirá a compra da produção excedente desses itens e pagará preços de mercado para assegurar a renda dos pequenos agricultores.

Lançado ontem em solenidade no Palácio do Planalto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o plano será coordenado pelo ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, mas terá a participação dos ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Integração Nacional. O governo também decidiu abrir uma nova linha de crédito de R$ 1 bilhão destinada a financiar planos de reflorestamento e recuperar áreas degradadas em todo o país — e não somente na Amazônia.

O governo ainda não definiu o cronograma de liberação desses empréstimos pelos bancos oficiais. “A Amazônia tem de ter um desenvolvimento diferenciado, bem elaborado, não podemos aceitar os predadores”, afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os tomadores de empréstimos para reflorestamento terão tratamento diferenciado pelos bancos. A taxa de juros prevista é de 4% ao ano, com carência de 12 anos e prazo de pagamento de até 20. O prazo e as taxas de juros foram definidos pelo Ministério do Meio Ambiente em razão do tempo exigido para o “amadurecimento” das árvores plantadas para que possam ser colhidas em um plano de manejo e da demora para que o negócio comece a dar lucro.

O PAS prevê quatro eixos de ação: o ordenamento territorial e gestão ambiental, a produção sustentada com inovação e competitividade, a implantação da infra-estrutura para o desenvolvimento sustentável e inclusão social e cidadania com a adoção de programas de atendimento a desempregados da Região Norte. “Eu fui chamada o tempo todo de ministra dos bagres”, alfinetou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, chamada em tom de brincadeira de “mãe do PAS” pelo presidente Lula. Ela se referia à polêmica dentro do próprio governo sobre a liberação ou não do licenciamento para a construção das hidrelétricas do Rio Madeira, em Rondônia.

Estavam presentes na solenidade os governadores dos estados da Amazônia Legal, com exceção do governador de Roraima, José de Anchieta Jr., que não compareceu em protesto pelo apoio do governo à demarcação da reserva Raposa Serra do Sol em áreas contínuas.

Para a coordenadora da iniciativa amazônica do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos, uma das medidas mais significativas do pacote é o penhor florestal. Segundo ela, a proposta mostra que o governo tem interesse em investir nas atividades que preservam a floresta em pé. A medida, segundo ela, atende a uma reivindicação histórica dos produtores regionais. “Estamos tornando a atividade florestal tão facilitada quanto a atividade agrícola”, compara. Ela ressaltou, no entanto, que o conceito de sustentabilidade precisa ser incorporado à prática da exploração agrícola brasileira.

Incentivos

  • A madeira da floresta nativa poderá ser utilizada como ativo do proprietário rural e oferecida como garantia para a tomada de financiamento para a implantação de projetos de manejo florestal. Hoje, apenas a terra pode ser dada em garantia de empréstimos.
  • Financiamento de projetos de reflorestamentos terão prazo de até 20 anos para serem pagos. Os bancos vão receber como garantia a floresta futura a ser plantada em áreas degradadas.
  • Os produtos extrativistas recolhidos nas florestas serão incluídos no programa de preço mínimo do governo. Isso significa que a Companhia Nacional de Abastecimento(Conab) vai comprar a produção excedente ou comprará a produção quando os preços estiveram muito abaixo do custo de produção, como ocorre com a produção de grãos. Isso vai atingir as castanhas, as frutas e a seringa, por exemplo
STF libera concessão de florestas

O Serviço Florestal Brasileiro se prepara para retomar o primeiro processo de concessão de florestas no país, que prevê o manejo sustentável da Floresta Nacional do Jamari, em Rondônia. A liberação para o reinício da iniciativa foi dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ao cassar, na segunda-feira, uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que obrigava a União a interromper o projeto. O presidente do STF, Gilmar Mendes, defendeu que, no caso da licitação — como previsto pelo governo federal —, a aprovação prévia do Congresso Nacional não é necessária, contrariando a tese da desembargadora Selene Maria de Almeida.

“Não se pode confundir concessão florestal com concessão dominial. A concessão florestal não implica transferência da posse da terra pública, mas sim delegação onerosa do direito de praticar o manejo florestal sustentável na área”, argumentou o ministro.

O processo de licitação da Floresta Nacional do Jamari havia sido suspenso em março, em caráter liminar, até que o Congresso Nacional emitisse uma autorização prévia para a concessão. A decisão se baseou no artigo 49 da Constituição Federal, que determina que a concessão de áreas públicas deve ter a aprovação prévia do Congresso Nacional quando envolver áreas superiores a 2,5 mil hectares.

O edital de licitação da Floresta do Jamari, o primeiro para concessões florestais para manejo sustentável do Brasil, foi aberto em novembro do ano passado. O Serviço Florestal recebeu 19 propostas de 14 empresas dos estados de Rondônia, São Paulo, Bahia e Pará, durante os 45 dias que o edital ficou aberto. Duas empresas foram desabilitadas por falta de documentação. A empresa que vencer a licitação deverá conservar a área e poderá explorar produtos florestais como madeira, óleos, sementes e resinas, desde que use técnicas de manejo sustentável. O vencedor poderá ainda oferecer serviços como ecoturismo e atividades esportivas. Os recursos arrecadados com a concessão devem ser empregados na fiscalização, no monitoramento e controle das áreas licitadas.

Estudos sobre aquecimento

Para reduzir os impactos das mudanças climáticas no Brasil e garantir que as populações mais vulneráveis se adaptem a transformações no sistema climático, é preciso antes detalhar as conseqüências do aquecimento global sobre os ecossistemas do país, de acordo com representantes do governo e da sociedade civil, que participam da 3ª Conferência Nacional do Meio Ambiente. “O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática) tem seus modelos, mas são modelos de larga escala, o que nós estamos tentando fazer é buscar aprofundar, melhorar a nossa capacidade de projetar as vulnerabilidades dos vários sistemas aos potenciais impactos que a mudança do clima poderia trazer (para o Brasil)”, defendeu a secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Thelma Krug.

Entre as conclusões que o painel de cientistas das Nações Unidas apresentou em 2007, em seu quarto relatório, estão cenários que prevêem a savanização da Amazônia (a floresta passaria a ter estrutura semelhante à do cerrado) e a transformação do semi-árido nordestino em deserto. De acordo com a secretária do MMA, um dos eixos da Política Nacional de Mudança do Clima, que deve ser enviada ao Congresso este ano, trata especificamente do estímulo a atividades de pesquisa e desenvolvimento relacionadas às transformações climáticas.

“É fundamental que a gente conte com o apoio de pesquisas muito específicas para o Brasil, que mostrem um perfil mais preciso sobre o nosso território”, avalia. A recém-criada Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais Rede Clima foi citada pelo representante do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Marcos Freitas, como uma das ações fundamentais para subsidiar a elaboração das políticas públicas sobre o assunto.

Fonte: Correio Braziliense