3 de agosto de 2007

Artigo

O tráfico de animais
Rebecca Garcia

O tráfico de animais silvestres é o terceiro do mundo, atrás apenas do tráfico de drogas e do tráfico de armas. Pior que isso, as estatísticas mostram que de cada dez animais capturados pelos caçadores apenas um chega vivo ao final da via crucis, ao cativeiro a que se destina.

A Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional (Caindr), na Câmara Federal, aprovou requerimento de minha autoria, neste final de semestre legislativo, para a realização de um seminário sobre a questão atual e futura do tráfico de animais silvestres no País, assim como acerca do trabalho realizado pelos Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), do Ibama.

Os Cetas, na teoria, existem para avaliar as condições de retorno ao ambiente de origem dos 45 mil animais silvestres, em média anual, apreendidos ao tráfico no território brasileiro, nos últimos três anos. Na prática, os Cetas são poucos, não têm recursos humanos ou financeiros suficientes e precisam de reformas nas instalações. A conseqüência é que a maior parte das solturas é feita sem critério e não se tem sequer a taxa de sobrevivência ou o impacto dessas espécimes sobre os demais indivíduos e o meio ambiente.

Estima-se entre 5 milhões e 30 milhões as espécimes animais existentes no planeta, embora apenas 1,4 milhão tenham sido descritas pela ciência. Destas, cerca de 10% encontram-se no território brasileiro. É nossa obrigação cuidar desse patrimônio.

Com efeito, após 30 anos desde a publicação da primeira lista de fauna ameaçada, com 86 espécimes, a última relação brasileira, de 2003, apresentou 683 animais. O Ibama, especialmente na gestão do amazonense Marcus Barros, iniciou um trabalho efetivo de combate ao tráfico, mas esbarra numa série de dificuldades.

Em 2004, em dois workshops, o Ibama estabeleceu os protocolos específicos para a avaliação dos animais com potencial para a soltura e abordou temas como comportamento, clínica, genética e áreas de soltura. Foi aí que surgiu o Projeto Cetas-Brasil, no qual foram definidas as regiões prioritárias para a implantação dos mesmos, de acordo com a rota do tráfico.

Chamei para o seminário Flávio Montiel, diretor da Diretoria de Proteção Ambiental (Dipro), João Pessoa Riograndense Moreira Jr., diretor da Coordenação de Uso da Fauna (Coefa), Raquel Farias e Jair Moraes Tostes, técnicos do Coefa, e de João Alfredo M. Duarte, analista ambiental de Manaus, todos do Ibama, para discutir a questão dos Cetas. A meta é construir 118 desses centros e estamos longe de atingir esse patamar. Os problemas não estão apenas aí, mas passam por coisas menos concretas e talvez até mais difíceis de superar, que é o substrato cultural da população brasileira. Quem não viu um vizinho ou mesmo não teve em casa um pássaro engaiolado ou um animal silvestre de estimação, ainda mais num Amazonas tão próximo da natureza em que vivemos?

A estrutura de combate ao tráfico é muito importante, mas, talvez, quando nos arredores de Manaus não tivermos mais os caçadores de curiós, com suas terríveis gaiolas recobertas, teremos obtido uma grande vitória. E não é incrível que, há poucos anos, tenham sido fechadas em nossa cidade lojas onde centenas de animais eram vendidos abertamente?

O seminário virá, no segundo semestre, espero que em Manaus. Tenho muita esperança nos desdobramentos dele.